Artigo de Opinião Economia

Banalização, mentira e incompetência matam a UNIOGBIS

Recebi na minha caixa uma convocatória, enquanto jornalista, para participar (se achar conveniente) na cerimónia do encerramento do Bureau das Nações Unidas para a Consolidação da Paz na Guiné-Bissau (UNIOGNIS) no próximo dia 11 de Dezembro. UNIOGBIS é a tal estrutura da ONU (tipo olho do Secretário-geral) instalada no país depois da estúpida e desnecessária guerra de 7 de Junho de 1998.
Os seus objectivo são, em traços gerais, ajudar o país na Consolidação da Paz, apoiando certas reformas políticas e sociais, sobretudo na formação de quadros e revisao ee alguma legislação.
Há muito que soube que o tal escritório, por força das vontades e não dos resultados, o Uniogbis seria encerrado. Primeiro, porque duas resoluções das Nações Unidas (resolução 2458 (2019), confirmada pela resolução 2512 (2020)) assim decidiram e nada se fez para que fosse renovado. Ou seja, nem o Governo e muito menos a Presidência da República da Guiné-Bissau acharam necessário a continuidade da missão.
Como não me interessa o debate sobre se foi bim ou não para o PAÍS e nem quero fazer o papel de advogado do diabo, terá razão quem entender que a missão deve ser encerrada, porque os resultados não são palpáveis. E, obviamente não são assim tão visíveis para os menos atentos. Portanto se for em julgamento público, o Uniogbis infalivelmente será condenado.
Mas estarão certamente a morrer de revolta aqueles que têm, noção do poder da diplomacia e da importância que tem uma mensagem que chega às mãos do Secretário-geral das Nações Unidas. Aqueles que sabem de dezenas, senão centenas de catástrofes que a intervenção da Comunidade Internacional e em particular da ONU evitaram na Guiné-Bissau. Aqueles que sabem, o peso da palavra sanção quando pronunciada pela ONU. Antes da banalização de figuras e instituições neste país, o UNIOGBIS tinha efeitos visíveis. O Gabinete começou a morrer, quando alguns dos seus gestores começaram a promiscuir com figuras políticas.
Pessoalmente, até não sou fanático da UNIOGBIS, porque nunca concordei com o modelo de relacionamento utilizado com a comunicação social (sobretudo com os patrões da imprensa e a política de apoio nas acções de formação e reciclagem ou a forma de financiar as actividades jornalísticas), mas seria aberração e absoluta ignorância minhas, se ousar afirmar aqui que a sua continuidade não se justifica. Justifica sim e os motivos não faltam,. UNIOGBIS era uma estrutura que simbolizava (pelo menos simbolicamente) a necessidade de se prestar atenção a este país.
Um país onde a estabilidade jamais existiu desde da guerra de 7 de Junho. Portanto é um acto criminoso, ouvir as pessoas a justificarem o fecho da UNIOGBIS com a existência da paz e estabilidade na Guiné-Bissau. Mentira. E que mentira!!! Vamos aos factos que provam que são mentirosos, aqueles que alegam que a missão deve encerrar, porque há paz na Guiné-Bissau.
Primeiro facto, um dos candidatos a Presidência da República não está no país há 10 meses, por questões de segurança.
Segundo facto: O Presidente da ANP (e sabe-se lá como continua a sê-lo) renunciou (se renunciou é porque havia assumido e investido) às funções de Presidente interino da Guiné-Bissau por alegadas questões de segurança. Aliás, insegurança.
Terceiro facto: O Primeiro-ministro saído das eleições legislativas de 2019 está neste momento (na hora de edição deste artigo) refugiado na UNIOGBIS por questões de segurança;
Quarto facto: Umaro Sissoco Embaló disse, há seis dias, estar disponível para corpo a corpo com quem lhe insultar;
Quinto facto: O deputado do APU, Marciano Indi, foi raptado e espancado.
Sexto facto: Armando Correia Dias, membro do Comité Central do PAIGC foi sequestrado e acusado de posse ilegal de arma:
Sétimo facto: de Abril de 2020 até Agosto último, o Supremo Tribunal de Justiça ficou encerrado, porque os Juízes Conselheiros temiam pela vida. Dois tiveram que refugiar na Uniogbis;
Oitavo facto: Dois Militantes de MADEM denunciaram terem ter sido espancados por forças de segurança na Presidência da República;
Nona facto: A Rádio Capital (por um problema apenas de liberdade de imprensa e de expressão) foi assaltada e vandalizada e o processo está no segredo dos Deuses.
Décimo facto: O Procurador-Geral da República diz alto e em bom som, que tomará medidas e doa quem doer. E aparece ainda para deixar recados a uma certa classe política.
Não faz parte dos factos a mensagem tornada pública há dois dias pelo presidente da Comissão Nacional de Eleições (CNE), José Pedro Sambú (severamente contestado pelo partido que suportou um dos candidatos), quando diz que lhe perguntaram se era possível fazer novas eleições legislativas em 90 dias.
Não faz parte dos factos, o clima de incerteza que se vive no parlamento, onde o impasse entre os deputados não está a levar em consideração os debilitados estados de saúde do presidente e segunda vice-presidente e decidiram simplesmente negar o preenchimento de vaga do 1º vice-presidente.
Não fazem parte dos factos, os recados que ouvimos entre Umaro Sissoco Embaló e alguns deputados.
Não faz parte dos factos o violento ataque que um deputado do MADEM desferiu contra o seu vice-líder, ao ponto de chamá-lo de um complexado.
Não faz parte dos factos o discurso agressivo de Umaro Sissoco Embaló contra os cidadãos, onde num puro crioulo, avisa que ‘a criança que não anda com a mãe, mexe na colmeia”.
Não fazem factos, os rasgados elogios que Umaro Sissoco Embaló tem feito a si, de ter supostamente calado a Comunidade Internacional na Guiné-Bissau e impedido a sua intervenção nos assuntos internos.
Não faz parte dos factos a tensão existente na classe política Guiné-Bissau sobre o que fazer em relação a Constituição da República. Existe um Projecto de uma Comissão parlamentar, julgado competente para efeito, mas existe uma proposta de Umaro Sissoco Embaló, portanto julgado incompetente, mas com fortes possibilidades de afirmar.
Não faz parte dos factos, as acusações implícitas que o Presidente da ANP, Cipriano Cassamá faz às intenções de Umaro Sissoco Embaló quando impôs a figura de vice-primeiro-ministro ao país, à margem da Constituição.
Não faz parte dos factos, a incerteza que se vive no processo de droga, o caso Navarra que já tem condenados, absolvidos e volta a ter acusados.
Perante estes factos e não factos, das duas, uma: ou a mentira que às autoridades da Guiné-Bissau têm muito poder e conseguiu esconder a verdadeira face do país a ONU, ou a Senhora Representante está a ser demasiadamente incompetente para expor ao Secretário-geral os verdadeiros problemas deste país.
É falso argumentar a saída da UNIOGBIS na Guiné-Bissau com o cumprimento da sua missão. Extremamente falso. São empíricas, as afirmações de que às presenças da comunidade Internacional, tipo UNIOGBIS, tolhem o investimento. Imaginações e conversas de cafés. A não ser que o poder de lobby interno acabou por afirmar para puderem comer-nos assados depois, mas o que é verdade é que a missão da UNIOGBIS está longe de ser cumprida. Muito longe mesmo. Este país não tem, paz e nem tem estabilidade. E calar a CI é deixar os cidadãos a mercê dos desmandos de uma classe política “quase predadora”.

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