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Advogados dos detidos escrevem ao PR para denunciar irregularidades e alegar que “o processo nunca foi transferido para o Tribunal Militar”

Os advogados de defesa dos detidos da suposta tentativa de golpe de Estado no dia 1 de Fevereiro de 2022 endereçaram em Setembro último, uma carta ao Presidente da República para falar das irregularidades que segundo eles eivam o processo. Conforme os advogados, o próprio processo está sob alçada dos tribunais e nunca foi transferido pelo Tribunal Militar. Os advogados consideraram de violação da Lei o facto do Presidente do Tribunal Superior ter exarado um despacho para a transferência desses detidos supostamente por questão de segurança de um estabelecimento prisional para um lado, sem no entanto apresentar o despacho do magistrado titular dos processos.

Os detidos ainda reclamam a apresentação dos mesmos a justiça, pelo que consideram a intervenção do Presidente da República pertinente para mudar essa realidade.

Na íntegra a Carta

CARTA ABERTA DO COLETIVO DOS ADVOGADOS SOBRE CASO “1 DE FEVEREIRO DE 2022

Á

Sua Excelência Senhor, Umaro Sissoco Embaló, Presidente da República da Guiné-Bissau, General do Exército e Comandante Supremo das Forças Armadas.

Bissau, 21 de Setembro de 2023

Assunto: CARTA ABERTA

Excelência,

Senhor Presidente da República, que Deus lhe conceda a saúde e longa vida na sua nobre função que desempenha, em nome do desenvolvimento do Estado da Guiné-Bissau.

O coletivo dos Advogados dos “presos” no caso um de Fevereiro de 2022, vem, por intermedio desta missiva, manifestar de forma inequívoca, a indignação face a morosidade judicial, relacionada ao caso supra que se encontra no Gabinete do Presidente do Tribunal Militar Superior, que recentemente os guineenses foram confrontados com a “ transferência dos reclusos”, por despacho emitido por este senhor, Presidente da Corte Suprema Militar, que culminou com a transferência imediata dos presos no caso em referência para a prisão militar de Base Aérea, por alegado motivo de segurança e melhoria das condições prisionais.

Facto que preocupa o coletivo, considerando que, o Presidente do Tribunal Militar Superior solicitou a transferência dos presos, sem que, no entanto, tenha apresentado o despacho judicial do Magistrado titular dos autos que suportasse o pedido ora formulado.

Porém, do que se sabe até que se prove o contrário, processualmente falando, o processo em liça, nunca foi transferido para a jurisdição Militar. Isto porque, dos supostos atos ou tramitações processuais que se alegam no Tribunal Militar, padecem do vício de forma preterível e de sem efeito. Na medida em que, quer o coletivo dos Advogados, quer aos ditos reclusos, nunca se quer foram tidos nem achados para o efeito do exercício do contraditório da possível remessa dos autos a aquela jurisdição.

Ademais, de referir que, o supracitado processo, na fase do inquérito registava-se sob nº 74/2022, no Ministério Publico Junto a Vara-Crime do Tribunal Regional de Bissau, para o Juiz julgador registado sob nº 267/2022. Porém, após a conclusão do inquérito, ficou supostamente provado o envolvimento de aproximadamente uma dúzia dos presos, que por ora, a prisão já é extemporânea. Ainda, existem presos numa média de três dezenas com as ordens de solturas, quer do Ministério Publico, de um lado, quanto as ordens de solturas do Juízo de Instrução Criminal, derivados do arquivamento, essas ordens de solturas foram sistematicamente recusados nos serviços de diversas penitenciarias, nomeadamente; AQUARTELAMENTO DA MARINHA NACIONAL, BASE AÉREA E SEGUNDA ESQUADRA.

Excelência Presidente, todos nós reconhecemos que, naquela fatídica tarde do dia 01 de Fevereiro, houve mortes a lamentar, porquanto, são homens, chefes da família que pereceram suas vidas em pleno exercício das suas funções de defender os titulares dos órgãos da soberania e as Instituições da República. Assim, qualquer que seja o móbil, é condenável a todos os níveis. Por isso, o Coletivo dos Advogados subscritor desta carta é ciente do quão foi doloroso naquela dia.

Com efeitos, o Coletivo, não exige apenas a libertação dos detidos, antes pelo contrário, exige o cumprimento da Lei, que, passa necessariamente pela realização da Justiça, e tem como consequência, a definição clara da situação jurídica de cada um dos implicados ou detidos. Pois, Senhor Presidente, entre os detidos há vários grupos com situações diferenciadas;

(i) O primeiro grupo, nem se quer foi ouvido pelo Ministério Publico, ou seja, os seus nomes não constam da lista do Ministério Público como suspeitos á investigar, apesar de tudo, este grupo continua ainda preso;

(ii) O Segundo grupo, os seus nomes constam da lista do Ministério público e, foi ouvido, mas que, entretanto, de acordo com a convicção do Ministério Público não há indícios do seu envolvimento no caso, por isso, não foi acusado, e, consequentemente foi emitido mandado de soltura, que infelizmente até hoje não foi cumprido;

(iii) O Terceiro grupo, consta da Lista do Ministério Público, foi ouvido e acusado. Mais que, entretanto, durante o debate Instrutório junto do Tribunal de Instrução Criminal, a Mmª Juíza não ficou convencida do seu envolvimento e arquivou as suas acusações, e, consequentemente, ordenou a soltura, que também, infelizmente não foi cumprida ate hoje;

(iv) O Quarto grupo, consta da Lista do Ministério Público, foi ouvido e acusado, durante o debate Instrutório junto do Tribunal de Instrução Criminal, a Mmª Juíza ficou convencida do seu envolvimento e mantem-se a acusação, apesar de manter as acusações, mas, entendeu que, a liberdade deste grupo não colidiria com a moral pública, nem haveria perigo de fuga a justiça ou obstrução atividade jurisdicional e, em consequência, ordenou a soltura deste grupo, para aguardar o julgamento em liberdade, que também, infelizmente não foi cumprida ate hoje;

(v) O Quinto e ultimo grupo, consta da Lista do Ministério Público, foi ouvido e acusado, durante o debate Instrutório junto do Tribunal de Instrução Criminal, a Mmª Juíza ficou convencida do seu envolvimento e mantem-se a acusação, de facto, este ultimo grupo não beneficiou de nenhuma soltura, ou seja, a Mmº Juíza entendeu que, a liberdade deste grupo colidiria com a moral pública, pode haver perigo de fuga a justiça ou obstrução atividade jurisdicional e, em consequência, ordenou a manutenção deste grupo em prisão preventiva, embora o prazo da Prisão Preventiva esteja largamente ultrapassado;

Todos estes cinco grupos diferenciados, há muito que as suas prisões, se transformaram numa detenção ilegal, se não mesmo num sequestro, porquanto, tanto os que têm mandado de soltura e que não foram cumpridas assim como aqueles que têm a ordem de Prisão Preventiva, todos os prazos processuais já foram largamente ultrapassados.

Excelência Presidente, diante destas gritantes incongruências jurídico-processual e administrativas, o coletivo está convencido que, conhecendo a sua sensibilidade quanto á matéria dos Direitos Humanos, o Senhor Presidente não ficaria indiferente perante essas violações flagrantes da lei e do Direito e Liberdades Fundamenais dos detidos, o que coloca em causa o “Estado de Direito Democrático.” Certamente que, o Senhor Presidente comunga a ideia de que, o Estado deve respeitar e fazer respeitar as decisões das Instituições (Tribunal) criadas pelo próprio Estado.

É repugnante, ver um ofício dum Presidente do Tribunal Militar Superior, autointitular-se e usurpando a competência do Promotor Titular, solicitando a transferência dos presos duma penitenciária civil para Militar.

Outrossim, a cela de Base aérea é só para os militares em cumprimento de pena, ou, os afetos a este aquartelamento. Não os civis!

Excelência Presidente, “TUDO ISSO QUE ESTAMOS ASSISTIR DESDE 2022 ATÉ HOJE É UMA CLARA DENEGAÇÃO DA JUSTIÇA”. Na medida em que o Presidente da Corte Militar Superior, nunca pode exercer a titularidade processual (primeira instância). Pelo que, em caso algum, dispõe da competência funcional para o efeito (se não violação gritante dos estatutos de Magistratura Militar e Lei da Justiça Militar, bem como Regulamento Disciplinar Militar-RDM). Ademais,

Estranha ainda mais, o Ministério do Interior, ter imediatamente executado o ofício do Presidente do Tribunal Militar Superior, datado de 19 de Setembro, em detrimento dos vários mandados judiciais de solturas pendentes por cumprir… nunca executados.

Como é possível, quando o Tribunal ordena a detenção, as pessoas correm para deter em nome da Justiça, e, quando o mesmo Tribunal, ordena a soltura as mesmas pessoas que detiveram recusam cumprir a decisão judicial, a pretexto da ordem superior?

O processo em causa, é oculto e inacessível pelos intervenientes processuais, de igual modo, é inacessível o contato dos Advogados aos seus constituintes (denegação de justiça).

Verificado o desconhecimento das motivações, quer da remessa dos autos para o Tribunal Militar, bem como da referida solicitação de transferência dos presos, incluindo os civis, para uma prisão de cumprimento de pena efetiva exclusivamente dos Militares.

Todavia, as informações dão conta que, no referido Tribunal, sob competência funcional do Promotor titular, declarou INCOMPETENTE EM RAZÃO DA MATÉRIA, aguardava-se apreciação e julgamento do incidente de conflito negativo de competência pelo TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE BISSAU, que lá vão um ano sem resposta. Assim, em nenhum momento se pode praticar um ato processual no respetivo processo antes que seja decidida o incidente que fez suspender a tramitação.

Conclusão:

Excelência, na sua qualidade de Garante da Constituição, e do normal e Regular Funcionamento das Instituições e das demais Leis da República, preocupa em certa medida o coletivo dos Advogados, por ora, e quer que seja feita a justiça o mais rápido possível, no sentido de apurar a veracidade e responsabilizar os supostos culpados envolvidos no atentado que ceifou a vida de vários cidadãos, de um lado, por outro lado, Vossa Excelência, intervenha, usando a sua Magistratura de influência, para que seja ordenada a soltura imediata dos presos cujos mandados de solturas se encontram nas diversas penitenciárias.

O Coletivo dos Advogadosdo

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