São centenas entre homens e mulheres num modelo de luta ímpar para obtenção dos seus direitos. Maioritariamente mulheres já em idade avançada a lutar para sobreviver, quando ainda existirem às forças. Pelo menos foram essas garantias que deixaram. Até no confronto com a polícia na manhã do dia 10 de Junho corrente. Durante o dia, acantonam a frente do Ministério da Educação com possíveis mantimentos em jeito de luta para a obtenção dos seus direitos que consiste em receber o salário de limpeza que fazem, nas escolas, sem mínimas condições e sem quaisquer equipamentos de protecção. São cerca de 1382 entre activos, doentes, desistentes e mortos. Prestavam serviço em 38 escolas públicas de Bissau nessa condição. O salário que reclamam é de cerca de 19 a 25 mil Fcfa, para aqueles que recebem bem. Só que, em 2018, depois da fixação do salário mínimo na Função Pública, aumentaram a fasquia. Para eles, a partir dessa data, contam com 50 mil Fcfa por mês. O total da dívida em termos estimativos é de 1 bilião de Fcfa, conforme avançou ao UH, Sene Bacai. São orientados nessa luta “de razões” pela Associação Nacional para a Protecção dos Trabalhadores Domésticos na Guiné-Bissau (ANAPROMED-GB) liderados por Sene Bacai Cassamá. Nem todos conseguem, resistir. Contaram que, no dia 9 de Junho, uma senhora caiu e foi levado para o hospital, mas não explicaram como é que as diligências de tratamento foram feitas, se já não têm um único Fcfa. E antes de consolidar essa informação, uma outra pessoa caiu.
Acantonar a frente do Ministério ou dormir ao relento, não foram as primeiras estratégias, mas são agoiras das poucas que restam, para essa luta sem fim a vista. Depois das pressões junto das escolas onde trabalham e que tinham a obrigação de pagar através dos fundos próprios, passaram para o Ministério da Educação, estrutura máxima que tutela as escolas. Começaram a luta de forma institucional com troca de missivas, entre a Associação e a Direcção dos Recursos Humanos do Ministério da Educação Nacional. Num dado momento preferiram mudar de estratégia, porque a via institucional com correspondências não estava a surtir efeitos.
Sene Bacai, diz que a estratégia mudou, por os factos demonstram uma clara falta de interesse do Governo em resolver um problema, que nem devia ter lugar. A estratégia mudou, porque concluíram que, para o Governo, essa camada da Função Pública não conta. Não fazem parte do banco de dados do Ministério da Educação e muito menos da Função Pública. São, por via da lei, trabalhadores fictícios, mas muito bem reconhecidos pelas suas escolas onde alguns já prestam serviço há mais de 24 anos.
Em declarações a imprensa depois da luta retomada no dia 9 de Junho, Sene Cassamá assegurou que, depois de receberam garantias do Ministério da Educação de que os problemas seriam resolvidos, deram, benefício de dúvida, embora continuavam a acompanhar a evolução dos acontecimentos. Porém, dois meses depois, tiraram todas as ilações em como, este pessoal menor, não faz parte da agenda do Governo e muito menos do Ministério da Educação.
“Depois das primeiras reivindicações que fizemos, meteram-nos em, contacto com os responsáveis do pessoal do Ministério da Educação. Nos nossos dados, são cerca de 600 pessoas nessas condições. Como acompanhávamos a situação, o pessoal do Ministério nos adiava a resposta dia após dia. Ora diziam dentro de dias, ora dentro de um mês. As tantas concluímos que não estavam a fazer nada”, disse o presidente.
E não estavam a fazer mesmo nada, conforme argumentou. Segundo ele, o Ministério da Educação não dispõe no seu base de dados quaisquer informações sobre essa categoria. “Como é que apercebemos daquilo? Quando iniciamos a luta pediram-nos dados para puderem confrontar com o seu base de dados. Depois, apercebemos que os únicos dados que tinham eram aqueles que acabamos de lhes entregar. Em certos momentos, os responsáveis do Ministério da Educação não hesitavam em informar que não tinham na sua posse, as cartas que enviamos. Com esse comportamento concluímos que há falta de vontade para resolver este assunto”, disse Sene Bacai Cassamá, como forma de fundamentar essa nova estratégia de acantonamento a frente do Ministério da Educação. Bacai Cassamá revelou ainda que, abdicaram do Ministério da Educação, porque não só não tinham dados, como também deturpavam aqueles que recebiam. “Querem pôr em causa os nossos números e minar o trabalho que fizemos há muito”, criticou Bacai, que assegurou que, o Ministério da Educação está a revelar-se incompetente para resolver o problema.
Muita corrupção das direcções das escolas
Para quem não acompanha de perto, o problema parece ser fácil. Não é. É complexo e tem muitas envolvências. Depois de ANAPROMED-GB se envolver, começou a investigar algumas denúncias. Os trabalhadores afectados explicam que, em certas escolas, depois de mais de um ano sem receber, sempre que a direcção paga, obriga-lhes a assinar 5 folhas de vencimento.
Sene Bacai revela que, como aquilo cheira a corrupção decidiram apenas fazer denúncias na Polícia Judiciária. “Tivemos informações de que os trabalhos já estão muito avançados e vamos aguardar pelo desfecho. Porque, aquilo que muitos Directores de Escolas fizeram é desumano. Não se pode no pagamento de um mês, obrigar alguém a assinar 5 folhas”, disse o Presidente.
Mas o problema em relação às escolas é ainda maior. Segundo informações chegadas ao Jornal, num, dado momento, algumas escolas ordenaram o pessoal menor a abertura de contas para que os seus salários sejam depositados. Nestas condições, os dados da ANAPROMED-GB apontam para 600 pessoas. “Também estão a serem investigadas pela Polícia Judiciária. Estas contas, quase todas elas, foram abertas no Banco BAO”, informou.
Para ele, umas das estruturas com mais cumplicidade neste processo são às próprias escolas, porque nunca colocaram no primeiro plano. Nunca demonstraram preocupados com um problema que era fácil de resolver. “Não acrescia mais de 300 mil Fcfa em nenhuma escola, mas infelizmente os Directores nunca pensaram nesse sentido”, atacou o Presidente.
Antes, a Função Pública é que contratava, mas a partir de 2006, as escolas receberam autorização para a contratação directa e pagar com fundos próprios. “Os Directores das escolas contratam, mas depois não preocupam em pagar. E foi assim que o dinheiro acumulou até chegar aos números de que estamos a falar”.
Vamos ficar aqui até o dinheiro sair
Nestas dívidas, alguns deles, não têm noção de quanto vão ganhar, até porque, não conhecem quais os critérios que o Governo ou patronato vai utilizar para o pagamento. Se haverá descontos ou não. No entanto, eles só sabem de uma coisa: só vão sair quando forem pagos aquilo que as escolas lhes devem,. Alguns na idade de reforma, já pensam só em receber o dinheiro, sem fazerem as contas.
Sene Bacai, enquanto quem está a frente dos trabalhadores revelou ao UH terem duas condições básicas. A primeira é o pagamento total de todas as dívidas em cerca de um bilião de Fcfa. A segunda é efectivação total de todos os trabalhadores nestas condições.
“Há muita injustiça neste processo. Não lhes pagam e nem, deram contratos de trabalho. Mas é claro na lei que, não se pode de forma alguma trabalhar com alguém mais de 20 anos sem contrato. Portanto são efectivos automaticamente. O que vamos exigir é que a efectivação seja formalizada. Esta é uma das condições para negociarmos”, disse.
Na manhã do dia 10 de Junho depois de acordarem ao relento, tomaram uma decisão de encerrar as portas do Ministério da Educação. Como fundamento, invocam o comportamento repugnante do ministro da Educação, Cirilo Djaló que, segundo eles, não mostra qualquer interesse nem para se inteirar ou resolver.
“Na manhã do dia 9 ele quando chegou, já estávamos acantonados a frente do Ministério. Sem cumprimentar ninguém, entrou com uma velocidade supersónica para o seu gabinete. Já no final da tarde quando ia para a casa, saiu da mesma forma. Para nós, este não deve ser comportamento de um governante. Pelo menos, podia fingir perguntar o que estava a passar”, lamentou, censurando severamente o comportamento que para ele “não é digno de um governante”. O ministro ignorou por completo os trabalhadores, mas eles comprometeram-se as não ignorar os seus problemas.
Portas do Ministério bloqueadas e a presença da polícia
Revoltados com o comportamento do ministro e sem ter quaisquer garantias de que o problema pode ser resolvido, optaram por agravar as reivindicações. Por exemplo ás 8 horas de hoje (10) bloquearam a entrada do Ministério com uma corda, alegando ser a única forma de levar as pessoas para mesa do diálogo. “Não haverá trabalho neste Ministério hoje”, dizias em uníssono, sendo que, alguns prometem. No preciso momento, uma senhora caiou e foi evacuada pela viatura da Rádio Difusão Nacional e directamente para os cuidados intensivos. A preocupação de momento é saber como será atendido, se o próprio Hospital está em greve. Sene Bacai até compreende a presença da Polícia de Ordem Pública, mas garante que a determinação é total. “Se haverá problemas, acho que não, se eles estiverem aqui para manter a ordem. Este é o modelo de protesto que escolhemos e acreditamos que vão respeitar”, afirmou, para maios adiante admitir que, estão disponíveis para assumir consequências em defesa dos seus direitos.
E a limpeza nas escolas?
Tal como as aulas, também estão paralisadas. Os Gabinetes dos Directores têm sido dos poucos que recebem às visitas das domésticas, mas nesses dias de luta, cada director tenta ocupar-se do próprio saneamento. Segundo os próprios contestatários, a maior preocupação de momento é saber se vão receber o dinheiro ou não.
Textos:
Sabino Santos
Fotos: Sabino Santos