O presidente do Tribunal de Contas, Dionísio Cabi, reconheceu que a corrupção “está fortemente enraizada na nossa sociedade, e que preciso reforçar poderes constitucionais dos órgãos de controlo interno. Outrossim, fazer funcionar os órgãos internos das instituições públicas. Em relação auditórias levadas a cabo pelo Tribunal de Contas em algumas instituições, assegurou constataram a existência de desfalque maior nas instituições como, Agência de Aviação Civil; ARN, EAGB, e no Conselho Nacional dos Carregadores.
Última Hora (UH) – Sr. Presidente do Tribunal de Contas, qual tem sido o papel dessa instituição de fiscalização de contas públicas, desde a sua fundação há 27 anos?
DC – Inicialmente o Tribunal trabalhava essencialmente no processo de aposição de visto de nomeações e reclassificações dos funcionários da administração pública. De algum tempo a esta parte virou para a fiscalização dos gestores públicos, através dos processos de auditorias e de verificação interna de contas, isto é, fiscalização concomitante e sucessiva.
UH – Porque só agora, o Tribunal de Contas ganhou corpo e alma para levar a cabo uma série de auditorias? Será que havia entraves de cunho político que o impediam auditorias à contas das instituições públicas do Estado?
DC – De um lado, deve-se o nível de desorganização interna que começou a ser superada em 2015, graças ao projecto Pro – PALOP – TL. De outro, os órgãos públicos tendem a resistir ao processo de fiscalização.
UH – Mas fala-se da existência de pressões ou seja lobbies políticos para que algumas empresas ou instituições públicas não fossem auditadas. Confirma?
DC – Desde que assumimos a Instituição tentamos contrariar essa tendência, sensibilizando aos órgãos públicos sobre vantagens de controlo na elevação do nível de prestação e na gestão criteriosa dos meios financeiros a disposição da entidade.
UH – Entre as instituições auditadas pelo Tribunal de Contas, quais são as que mais “desfalques” financeiro tiveram?
DC -A primeira maior conclusão que se chegou neste processo é que, todas elas têm um sistema de controlo interno bastante deficitário. O maior desfalque maior como é do conhecimento público através dos relatórios que foram tornados públicos aconteceram na Agência de Aviação Civil; ARN, EAGB, e no Conselho Nacional dos Carregadores.
UH – Depois de uma série de trabalhos realizados, o Tribunal de Contas decidiu remeter o relatório ao Ministério Público. Que resultado aguardam? Será que o processo vai ter o fim almejado pela vossa instituição?
DC – Os processos já se encontram na fase de promoção (acusação) pelos Procuradores Gerais Adjuntos junto do Tribunal de Contas, seguramente vão ser julgados todos os processos de fiscalização. Em função do trabalho feito, espera-se que vamos confirmar às constatações dos técnicos no julgamento. Não queremos a condenação de ninguém apenas por gosto. Queremos que ás pessoas sejam condenadas por não terem respeitado os procedimentos estabelecidos nas instituições que geriram.
UH – Quando é que o TC vai começar a julgar contas públicas…ou doutra forma, porque razão o TC não julga contas que audita ou investiga?
DC – Na verdade já foram submetidos a deliberação plenária de dois projectos de acórdãos. Os primeiros passos já foram dados nesse sentido. A paragem se deve a pandemia do novo coronavírus, que não permitiu apreciação destes projectos de acórdãos em Maio último. Mas vai acontecer a curto prazo.
UH – Auditar as contas num país como a Guiné-Bissau, por vezes é tida como uma perseguição política. Que leitura faz disso?
DC – O nosso dever e a nossa obrigação deve jogar mais alto do que o sentimento que as pessoas têm de nós no exercício da nossa função. Ao longo dos anos de exercício da função de fiscalização, fico com a sensação que este pensamento só vem na mente dos maus gestores e dos seus familiares beneficiantes deste enriquecimento ilícito. Na verdade é dever legal dos gestores apresentarem as suas contas de gestão para apreciação e julgamento no Tribunal de Contas. Quando não o fazem por iniciativa própria, o Tribunal de Contas vai fazê-lo. É o que temos feito.
UH – Disse numa das suas entrevistas quando iniciou o processo de auditoria há dois anos, que para ter sucessos nos próximos passos, que iam utilizar o método pedagógico. Foi isso que deu resultado?
DC – Seguramente não podemos logo forçar o julgamento dos processos de fiscalização realizadas, sob pena de enfrentarmos maiores dificuldades na obtenção de informações em processos subsequentes. Demos tempo, realizamos mais auditorias com a consciência de ajudar às entidades a encontrarem rumo e posteriormente julgar e responsabilizar os gestores pela má gestão.
UH – Porque é que se custuma dizer que a cultura de controlo e a cultura de fiscalização são das coisas mais difíceis que existem, sobretudo num país como a Guiné-Bissau?
DC – Simplesmente pelo nível de corrupção. A corrupção está fortemente enraizada na nossa sociedade e na nossa administração.
UH – Recentemente o Sr. Disse que a Guiné-Bissau é o oitavo país mais corrupto do mundo e acusou algumas entidades de se furtarem à fiscalização pela forma como fazem uso do dinheiro público. Pode nos citar exemplos em concreto?
DC: Me referia ao Supremo Tribunal de Justiça que tinha recusado auditoria criando argumentos que tolhe a fiscalização por parte do TC, enquanto chovem denúncias de desvio de fundos. É o caso mais flagrante, mas existem outros.
(UH) – Quando diz que a Guiné-Bissau figura no oito lugar entre os países mais corrupto do mundo, está a referir o relatório da Transparency International. Mas será que o Estado guineense tinha participado a ponto de ratificar uma Convenção Mundial de Combate à Corrupção (a UNCAC) que assenta sobre três pilares: prevenção, cooperação internacional e promoção de integridade.
DC – Compete a quem de direito ao nível Estatal defender perante comunidade internacional. Ao nosso nível como órgão de controlo externo das finanças públicas esta constatação internacional deve merecer a nossa preocupação.
(UH) – Para muitos, a corrupção é uma realidade visível na Guiné-Bissau. Mas como combatê-lo?
DC – Sendo um problema global tem que se copiar as experiências de outras paragens, realizar controlo periódicos, julgar as gestões e punir os gerentes infractores. É preciso também reforçar poderes constitucionais dos órgão de controlo bem como fazer funcionar os órgãos de controlo internos das instituições públicas. Neste particular, adoptá-los de autonomia e consigná-los uma verba suficiente para funcionamento. A par disso, os cidadãos devem denunciar actos de corrupção em obediência ao princípio da democracia financeira. Tendo em conta que no estado democrático social, os orçamentos são na sua generalidades abertos e participativos.
UH – Em todos os aspectos, a corrupção corrói os fundamentos do Estado de Direito e representa uma ameaça real para qualidade de democracia. Não acha que seria benéfico, introduzir no novo projecto da revisão constitucional medidas de combate antecorrupção?
DC – Basta a constituição reforçar os poderes aos órgãos de controlo, fundamentalmente ao TC como órgão de controlo externo das finanças públicas, será o meio caminho andado.
UH – Sr. Presidente, para alguns entendidos na matéria ou observadores da nossa realidade política e social, o aparente conúbio entre a esfera de negócios e política, a impunidade de alguns agentes políticos, constituem o factor fundamental para o enraizamento de corrupção. Que visão tem sobre a matéria?
DC – É evidente, para qualquer observador atento é fácil constatar que os gestores administrativos servem os políticos e os políticos defendem o acesso destes aos cargos públicos, estamos num ciclo vicioso de corrupção, e é urgente romper barreira para estancar o fenómeno.
UH – Há uma percepção dos guineenses de que a maioria dos detentores de cargos de poder na Guiné-Bissau são corruptos. Concorda que não?
DC – Não é fácil afirmar categoricamente, mas é verdade que a Guiné – Bissau vive no desmando em toda esfera da vida e é por motivo da corrupção.
UH – Qual é, de momento, o número exacto dos funcionários do Tribunal de Contas e as perspectivas de formação?
DC – No total são 115 funcionários, devido a necessidade de alargamento dos serviços do Tribunal de Contas nas regiões com anuência dos serviços competentes nomeadamente Ministério da Função pública e Ministérios das finanças houve recrutamento de mais 30 funcionários através de um processo de concurso público aberto. Relativamente a formação, na sua maioria são pessoas formadas em Direito, Economia, Gestão, Contabilidade e Administração e todo pessoal de serviço de apoio técnico possuem diplomas universitários.
UH – Há dias se publicou que ocorreram nessa instituição promoções sem observância aos critérios. O que tem a dizer sobre isso?
DC – Isto não corresponde a verdade, houve avaliação de desempenho feita pelos serviços competente e coordenada pela Secretaria – Geral do Tribunal de Contas. O critério é avaliação de desempenho como recomenda a lei laboral. Relativamente as categorias de Contador Geral e Auditor Geral, foram promovidos a este posto pessoas no topo de carreira que há 12 anos não beneficiaram de qualquer promoção. Convém destacar que este posto foi recentemente integrado na estrutura do Tribunal pelo Ministério da Função Pública. Quero sossegar-vos que a dinâmica actual do Tribunal de Contas é incompatível com actos sem critérios.
UH – Pensa estar por mais tempo a frente dessa instituição?
DC -A minha manutenção depende da confiança de quem me nomeia. A minha preocupação é dar sempre a minha contribuição para o Estado da Guiné – Bissau nos limites da minha força.
UH – Já deixou há muito de fazer a política activa…tem alguma explicação, ou está a preparar o regresso?
DC – É verdade desliguei da actividade politica, por incompatibilidade do exercício da função jurisdicional, mas no entanto mantenho a minha ligação com o partido como militante e quando justificar posso voltar e dar a minha contribuição ao nível da política partidária.
UH – De que gosta mais no seu tempo livre?
DC: Seguir o desenvolvimento da politica mundial e entreter com filmes de humor e infantil (luta pela sobrevivência no reino animal)
Quem é Dionísio Cabi?
Dionísio Cabi – Iniciou os estudos primários na Escola em Rossum, sector de Mansoa, região de Oio em 1971-1976. Frequentou o ensino básico elementar no Internato “Fernando Cabral em Bafatá, entre1977-1979.
De 1980 a 1983, prosseguiu seu estudo secundário na escola Piloto em Bolama, região de Bolama/Bijagós, concluiu o curso complementar no Liceu Nacional Kwame N’krhuma em Bissau no ano 1983-1985.
Antes da sua partida para o Reino de Marrocos para os estudos universitários, Dionísio Cabi leccionou como professor de História no Internato Fernando Cabral entre 1984 – 1986.
De 1986 – 1987 – foi professor de História no Internato Osvaldo Vieira em Morés.
Em 1987 – 1995, licenciou-se em Direito Público, especializando em administração Interna, pela Universidade Hassan II, Faculdade de Ciências Jurídicas e Económicas de Casablanca – Reino do Marrocos.
Durante o seu regresso ao país “Guiné-Bissau” Dionísio Cabi, cidadão guineense, natural de Rossum, sector de Mansoa, região de Oio, ingressou na fileira do Partido da Renovação Social (PRS), no ano 1995.
Desta à presente data, tornou-se militante activo, respeitando todos os princípios do Partido da Renovação Social.
Funções no Aparelho do Estado
De 1995 a 2000 – Professor de Direito Económico e Direito Comercial e Vice-Presidente do Conselho Pedagógico de CENFA em Bissau actual ENA;
De 2000 a 2015 – Professor de Relações Internacional em CENFA, actual ENA;
De 1999 a 2000 – Inspector Superior Adjunto de Luta Contra a Corrupção;
De 2000 a 2001 – Inspector Superior de Luta Contra a Corrupção;
Em 2001 – Ministro da Justiça;
De 2001 à 2002 – Ministro das Pescas;
De 2002 à 2003 – Ministro das Pesca;
Director do Gabinete do Presidente da República da Guiné-Bissau – Dr. Koumba Yala em 2003;
De 2003 à 2004 – Ministro do Equipamento Social;
Em 2006 – Presidente do Conselho de Administração da Empresa Guiné-Telecom;
De Novembro de 2006 à 2007 – Ministro do Interior;
De 2008 à 2009 – Ministro das Obras Públicas;
De 2012 à 2014 – Presidente do Conselho de Administração da Empresa Guiné-Telecom;
De 2014 à 2015 – Ministro Conselheiro do Presidente da República da Guiné-Bissau para área de Equipamento Social, Dr. José Mário Vaz;
De 2014 à 2016, Eleito Secretário Executivo da Associação de Luta Conta a Imigração Clandestina;
Em 2015 – Presidente do Tribunal de Contas a data presente;